sábado, 23 de fevereiro de 2013

RITUAL




                                     (Variação sobre o tema anterior de título "CINZAS", agora narrado com o enfoque de outra pessoa)      
                        

                           RITUAL  

                    Quarta feira de cinzas!

                     Fim do carnaval, término das folias, dos bailes, das fantasias, dos confetes, serpentinas, lança perfumes, marchas, sambas, descontração alegre em que famílias inteiras pulavam animadas, em geral as quatro noites de bailes!

                    Quarta feira de cinzas que punha um fim á euforia carnavalesca e que anunciava e trazia os pesados e contritos quarenta dias da quaresma.

                    E que forte significado sempre teve essa quarta feira! Um marco, algo realmente sério, contrito.

                   No entanto, foi justamente guardando as fantasias, nessa quarta feira de há muitos e muitos anos atrás que, num repente, a moça donzela, virgem e pura, romântica e sonhadora, ao encontrar na blusa da fantasia, que guardava para um ano de hibernação, três confetes remanescentes do banho de confetes verde e rosa que lhe dera aquele flerte das quatro noites de bailes, na última terça feira gorda, ao final do baile, como que pedindo atenção, querendo e exigindo se fazer  notar!

                 A jovem pura e sonhadora, entrou em êxtase ante os confetes, que tomou reverente e cuidadosamente com as mãos  e, num  gesto impensado, elevou-as ao alto, depois comprimiu-as com os confetes, bem junto ao coração e, como em ritual pagão, engoliu-os  com atitudes antropofágicas ou como se fora de uma comunhão total com o objeto e origem daqueles confetes, praticando, quem sabe, um coito ritualístico com o objeto de suas fantasias de carnaval!    

                                                                                

sábado, 16 de fevereiro de 2013

CINZAS

                                                                                  

 

                 CINZAS 

                 Quarta feira de cinzas!

                  Logo cedo, quando voltávamos fantasiadas e á pé do clube em que curtimos, pulamos, dançamos, brincamos, flertamos as quatro noites de carnaval, cruzamos com um grupo de jovens e senhoras de mantilha na cabeça ou no pescoço e terços e missais às mãos!

                Mamãe que nos acompanhava sempre, como mãe e foliona que sempre foi, como toda a minha família , nos recomendou discrição para que nossa euforia não agredisse às convicções religiosas do grupo passante.

              Nosso trajeto era de meia quadra, pois essa a distância do clube para a nossa casa, o que dispensava o uso do carro, mas foi o suficiente para o encontro, no mínimo interessante e propício a questionamentos  de foro íntimo.

             Após o banho, cama e á tarde, guardar as fantasias que hibernariam por um ano no mínimo, varrer os confetes e serpentinas, recompor a casa e retomar o cotidiano.

            Foi guardando as fantasias que encontrei, no meio ao colo da blusa, ainda alguns confetes remanescentes da folia.

            Esses três confetes, despertaram em mim, lembranças justamente do momento em que ali se alojaram e então, revi  na memória o lindo moreno de finos traços e grande e penetrantes olhos verdes, me dando um grande “banho” de confetes verde e rosa!

           Senti de pronto uma volúpia nunca sentida e, moça romântica e sonhadora , virgem e pura, irracionalmente e com ritual pagão, querendo não sei se comungar com o deus das fantasias, devorar o objeto dos sonhos, sei que ainda não entendi o real significado daquela antropofagia simbólica, daquela comunhão absoluta, daquele coito ritualístico e simbólico pois, pensando naquele lindo moço com quem não troquei nenhuma palavra ou aperto de mão, de quem nunca soube nem o primeiro nome, engoli solenemente os três confetes!

          Fiquei assustada mas em paz e, isso guardei como segredo absoluto  e omiti tal ritual até nas confissões feitas ao longo dos anos, só revelando agora, aqui, nestas lembranças que conto a vocês.                    
           

                                                                                                      

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

ALÔ, ALÔ CARNAVAL!

                           
                                            
                       ALÔ, ALÔ CARNAVAL! 

                   Mataram o carnaval! 

                   Sim, mataram o carnaval saudável, aquela explosão de alegria e de beleza, a descontração em que famílias inteiras, por séculos, brincavam juntas, unidas e com o mesmo prazer!

                  Na realidade, mataram-no já há alguns bons anos e, não contaram para ninguém.

                  Assassinaram a alma do carnaval, quando cercearam, eliminaram o seu perfume e, junto com ele, a liberdade, a espontaneidade.

                 Barrada, abafada, presa em camisa de fôrça a espontânea, pura e ingênua alegria do povo e de seus grupos de indivíduos, as famílias que, uma vez enquadradas, foram se apagando até que por fim,  o carnaval de apagou, feneceu, se diluiu e morreu.

               O crime, é que no lugar do velho, puro e bom carnaval, conduziram algumas peças desgarradas do núcleo familiar, para  outra fantasia.

              Deixaram de fantasiar as pessoas, para fantasiar o carnaval que, de festa de confraternização familiar e social, se tornou proletária e alcançou as ruas, conduzindo indivíduos avulsos em blocos, sob bandeiras e estandartes.

             Criou-se a concorrência do proletariado que sua a camisa  o ano inteiro, para desfilar pela sua bandeira, pela sua “escola” , por seu estandarte.

            Foi perdida a espontaneidade, a liberdade, pela apoteose dos brilhos, das purpurinas, dos altos saltos  a repicar sobre o asfalto das passarelas.

           Acabaram com os lança perfumes e, sem os cuidados e naturais censuras  das famílias e dos clubes sociais e familiares, ao ganhar as ruas, ganharam também a liberdade de se deixarem seduzir por outras drogas que, se ilegais também, percorrem as ruas e os becos como as passarelas.

           Mais difícil o controle em campo aberto. O proibido o clandestino, passou a ser objeto de desejo e de sedução. 

           As bebidas rolam pelas ruas tanto quanto o suor dos corpos tatuados, pintados, enfeitados e expostos na exuberância das sinuosidades da nudez que, moldada por silicones e próteses, se enfeita com plumas e paetês.

         Hoje, parte do povo paga para assistir a outra parte sambar comandada pelas baterias, sob a batuta daqueles que investem nas bandeiras e estandartes, ao ritmo dos interesses daqueles que custeiam e financiam a disputa fantasiada de alegria.          

                                                    
                                                   

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

NINHA

      
                                                                  
                          NINHA, hoje é seu aniversário, o texto é antigo, mas fica,
       
                   como homenagem pelo seu dia. 

                       NINHA

                        Que bem eu quero a minha pequena!

                        Das sobrinhas, a primeira.

                        Linda menina! Qual roseira

                       Vicejava que valia a pena!

                      Olhos vivos e sonhadores,

                      De um azul entre cobalto e anil,

                      Lábios pequenos e rosados,

                     Tez clara sabendo a marfim,

                     Rubras pinceladas, dos dois lados

                     Das bochechas delicadas,

                     A natureza em maternais ardores,

                     Primou-a como se fosse

                    Talhada a esmeril!

                    Assim era a minha menina,

                    Toda delicada e pequena,

                    Mimosa como que!

                   Entretanto, foi crescendo e,

                  A jardim rescendendo.

                  Nossa alma plena de encanto

                 Acompanhava seu balbuciar de canto,

                 Suas palavras primeiras.

                 Foi se desenvolvendo a pequena,

                 Sempre pequena e gentil,

                Até que a vida, como invejosa

                Quebrou em desencantos

                Essa beleza primeira e,

                A ela deu sina chorosa,

                De desabrochar em desencanto,

                Com dificuldades mil,

                De carinho, de amor e de pão!

                Cresceu a minha pequena

                Por entre as reviravoltas

                Da amarga sorte de ter,

                Desfeito o lar, de ver

                 O alicerce quebrar.

                 Por entre as reviravoltas

                 Da vida, em revoltas

                 Seu ser se expandiu!

                 Passou por fases a pequena,

                 Que o coração nos partiu!

                 Entretanto, hoje meu coração,

                 Cheio de pranto, a ela

                 Entoa uma canção

                 Ao vê-la assim tão pequena!

                 Tão frágil na sua rebeldia,

                 Tão doce no seu desencanto,   

                 Tão suave na sua agressão,

                  Com coragem e amor

                  Em seu ventre carregar

                  Um filho do amor!

                  Essa neném, a quem chama

                  Menina Juliana e,

                  Por quem sente

                  De longa data, e num repente,

                  A razão da vida e do amor.

                  Que Deus guarde a minha pequena!